Sempre me deparo com amigos que defendem com unhas e dentes o armamento do "cidadão de bem" - coloco entre aspas por que até esse conceito de "cidadão de bem" tende ser de um cunho moral que muitas vezes tem um lado político, mas isso já é outra história. Assim, como por aqui tem uma maioria que gosta de chutar o barraco antes de qualquer dialogo e passar para as ofensas, deixarei clara a minha posição de cético com relação à política armamentista, não contra, nem a favor, mas com a dúvida de que seja uma solução para a violência. Além de quê eu sou a favor do direito que o cidadão tenha uma arma em casa se assim bem entender tal como é atualmente mas carregar armas na rua é bem diferente.
Minha reflexão vem a partir de uma série de fatores, uma dela é o crescimento vertiginoso de homicídios passionais via arma de fogo, que, aliás, para quem mora em Salvador não é nenhuma novidade... A maioria já ouviu uma história ou uma notícia de jornal tempos em tempos aparece trazendo um fato do gênero com retratos como brigas de trânsito, brigas de bar, relacionamentos e etc. O numero de usuários de armas de fogo em torno de 15 milhões e estipula-se que 8 milhões não estejam regularizados... O uso regularizado ou irregular não define o uso para os crimes de homicídios, mas com certeza evidencia a incapacidade de fiscalização.
Outro fator que me põe cético com relação ao uso de arma de fogo é a leviandade com a morte. Como se usar ou não usar dinstinguisse a linha entre a salvação e a danação, ninguém lembra que primeiro é necessário saber usar a arma e ter a consciência além do suporte psicológico de que alguém pode perder a vida, inclusive você em uma reação a assalto há a possibilidade de que se pode errar o tiro e esse tiro atingir a pessoa errada. Um tiro não é só um tiro, a prova disso é que muitas vezes a polícia, que deveriam ser os profissionais aptos em relação a isso comete erros grotescos, vide os tiros de borracha atingindo rostos de jornalistas e mortes de inocentes em outros casos. Levando estes pontos em conta, não sei se eu teria uma arma de fogo, mas com certeza se outros usassem eu pensaria bem em investir em transporte blindado, colete balístico e etc...
Por fim, conheço poucos episódios nos quais os civis saíram por cima no uso de armas de fogo para reagir a assaltos, primeiro por que sempre está envolvido o fator surpresa, poucos se arriscam a cometer essa espécie de crimes por volta de lugares movimentados, geralmente em lugares vazios e com o menor numero possível de presentes e quanto mais camuflado melhor e nesse caso, como acabamos sendo revistados, pode não ser tão bom ter uma arma de fogo... Mas estamos tão sedentos por sangue e justiça que garganteamos que a sua prática deve ser feita com as próprias mãos. Matemos nossos inimigos! Vestiremos a camisa com a caveira do Justiceiro e faremos das ruas a nossa imagem e semelhança, ou ela já o faz sem sairmos de casa? Estamos suando balas e o conceito de justiça está definhando e caindo na barbárie.
quarta-feira, 23 de outubro de 2013
terça-feira, 22 de outubro de 2013
REPENSANDO RELIGIÃO - O Perigo da Normatividade Religiosa
Hoje em dia é muito comum ouvir-se falar de heteronormatividade e cisnormatividade, termos que denominam o padrão aceito e imposto pela sociedade quanto a questões de orientação sexual e de gênero, respectivamente. Existe também uma normatividade étnica: em nossa sociedade, o branco é o modelo; chegamos ao ponto em que personagens de quadrinhos são de pronto considerados brancos a não ser que existam marcas bem fortes de que sejam de outros grupos étnicos. Será que esses padrões impostos existem apenas quanto a comportamento sexual e etnia?
Não mesmo. Parece que sempre existirá um status quo em todos os campos humanos; mas o quanto ele pode ser desafiado, depende do período histórico. Felizmente, parece que vivemos numa época em que as religiões podem ser questionadas; mas ainda assim existe normatividade religiosa.
Em nosso país, as religiões cristãs são o modelo de normatividade religiosa. Toda religião é constantemente comparada com as religiões cristãs, ou com as outras religiões cristãs, caso se trate de uma religião cristã. Ainda que o Brasil continue sendo um país de maioria cristã, será realmente desejável passar todas as crenças pelo crivo e pelas decisões dessa maioria? E quanto a não-crenças? O quanto é pertinente a reclamação quanto ao "Deus Está Louvado" nas notas do Real, e o uso de símbolos religiosos em repartições públicas?
Eu não preciso ser ateu (e realmente estou longe de ser ateu, apesar de defender a necessidade de visibilidade cada vez maior para os ateus) para ir contra um "Deus Seja Louvado" numa nota de dinheiro. Em primeiro lugar, eu posso ser contra por motivos religiosos; posso achar que não condiz uma saudação divina numa cédula de dinheiro, que são duas coisas separadas. Para a minha religiosidade, essa frase é ofensiva. Imagine então o quão desagradável ela deve ser para quem simplesmente não acredita em Deus, ou acredita em qualquer outra divindade que não o "Deus", título eufemístico para o Jeová judaico-cristão. Acima de tudo, mesmo que eu não me importasse com essa frase, o que tem a ver o Estado emissor da nota com religião? O Estado deve ser laico, neutro diante de todas as religiões. Não deve apoiar nem esta nem aquela religião, mas proteger a liberdade religiosa de todos os cidadãos.
Se o Estado faz estas pequenas imposições, os indivíduos e as instituições religiosas também fazem suas imposições às vezes não tão pequenas. Como membro da Instituição Religiosa Cristã X, Fulano tem um pacote de crenças que não é exatamente o mesmo que o de Sicrano, membro da Instituição Religiosa Cristã Y, e muito menos que o de Beltrano, membro da Instituição Religiosa Muçulmana Z. Ainda assim em nosso convívio social Fulano, Sicrano e Beltrano impõem uns aos outros seus pacotes de crenças, embora não obrigando à conversão uns aos outros, mas agressivamente fazendo proselitismo, tentando interferir na política estatal legislando com base nos seus pacotes de crenças específicos, e julgando uns aos outros de acordo com esses pacotes.
As diferentes religiões surgem quando alguém discorda de um ou outro ponto do pacote de crenças que lhe foi dado. Se essas pessoas ou grupos de pessoas tiveram essa liberdade, por que não o cidadão comum? Por que ele é obrigado a aceitar pacotes prontos de crenças e dogmas?
Ainda que você aceite totalmente o seu pacote de crenças, lembre que a maioria dos seus semelhantes não o fez. Cada um deles tem o seu pacote, ou sua falta de pacote, o que não quer dizer que não tenham posturas diante da religião. A chave para a boa convivência religiosa, para a aceitação da diversidade religiosa, está no questionamento.
A alguns pode parecer paradoxal que o questionamento, que fomenta polêmicas e conflitos, possa trazer paz e aceitação. Mas é justamente quando você tem a coragem de desafiar estruturas rígidas, de negar o fanatismo e a intolerância, de questionar toda essa insensatez, é que está caminhando para um muito desejável futuro de diversidade religiosa irrestrita, sem interferências agressivas de um grupo contra outro.
Nas próximas postagens tanto comentarei incidentes e eventos ligados à religião, quanto tentarei desenvolver conceitos que possam ajudar a construir esse questionamento.
Meu nome é Arthur Ferreira Jr.'., tradutor de língua inglesa, revisor, escritor e monitor de língua latina, além de estudioso informal da religiosidade humana.
Ilustrações encontradas no Google Imagens
DIVERSIFICANDO - Nossos Inimigos Estão no Poder
Referindo-me ao posicionamento
do deputado Jair Bolsonaro em entrevista para o documentário da BBC de frente
para Sthephen Fry, gay assumido, eu digo que é
repugnante a falta de respeito, primeiro com o indivíduo que está em sua
frente, te olhando no rosto e que é um dos atores do que está sendo criticado
de forma ignorante pelo deputado falando sobre “os brasileiros não gostarem de
homossexuais” (?).
Bem, a maioria de nós entende que Bolsonaro vende sua imagem de forma polêmica para estar na mídia, para manter seu status quo de conservador (macho alfa de costas brancas) e assim formar inquietações sociais despertando ódio, raiva e repúdio em sujeitos com algum preconceito contra homossexuais legitimando certas atitudes contra LGBTs em redes nacionais – e agora internacional – que se configuram inclusive como assédio moral.
O NOSSO PROBLEMA é que ficamos todos passivos a isso dizendo que “ele só quer aparecer”, mas enquanto ele “só aparece”, gays são assassinados por aí e ele, em seu intimo, deve se deliciar. NOSSO PROBLEMA é que “O GIGANTE ACORDOU”, mas adormeceu novamente, porque quando Cássia Eller diz que “mudaram as estações,mas nada mudou” é no sentido de que a gente pode até mudar de atitude, mas os resultados são os mesmos e aí “Bolsonaros” protagonizam o lugar de ativistas de movimentos de minorias, que lutam por uma sociedade menos narcisista e menos violenta, que são eclipsados pois não interessa à mídia. E necessário fazer leitura critica dessas personagens (folclóricas), como Bolsonaro, que aparecem e formam a imagem de nosso país, se expropriando da nossa opinião brasileira, quando diz por nós que não gostamos de gays. Onde fica nossa identidade brasileira? De que forma nosso país é vendido quando se dá voz a um sujeito desses? É verdade que pais de gays não se orgulham deles porque eles são simplesmente gays? Segundo o deputado, sim.
Não é segredo que temos uma política que ainda é extremamente machista, conservadora e homofóbica, que esqueceu (ou se negou) de caminhar e adaptar-se às novas configurações de nossa sociedade onde as pessoas exercem, com muito mais liberdade, o seu direito de se expressar e ser quem é. Eu sou gay e meus pais tem orgulho de mim por tudo que eu sou e não é nenhum político de merda que vai dizer que pais de gays não tem orgulho de seus filhos. Pátria amada, ame seus filhos pelo que eles tem a contribuir para sociedade, para a humanidade. E escandaloso foi Cazuza quando disse que “nossos inimigos estão no poder” e eles permaneceram.
>>interessante ler: CORREIO: "Nós brasileiros, não gostamos dos homossexuais" diz Jair Bolsonaro
POÉTICAS DO DIA-DIA - Uma Cidade que Abandona Seus Monumentos, é uma Mente que Apaga suas Memórias Deliberadamente.
(…) Obras espalhadas pela cidade penam com degradação e falta de cuidadoPara Mario Cravo Jr., autor do Monumento a Clériston Andrade, incendiado no domingo passado, existe um descaso em relação às obras de arte da cidadeFonte: Correio
Clarissa Pacheco clarissa.pacheco@redebahia.com.brO vendedor ambulante Cleudo Alves da Silva, de 40 anos, trabalha há 15 na Praça Duque de Caxias, no Comércio. Ele está acostumado à vista do monumento em homenagem à Associação Ibero-Americana de Câmaras de Comércio, mas não se recorda da última vez em que viu a obra em bom estado. “Manutenção aqui? Nunca”. As duas mãos entrelaçadas, com mapas das Américas do Sul e Central, além da Península Ibérica, estão com a pintura dourada desgastada. Parte da escultura foi pintada de verde, há frases pichadas, riscos, arranhões e até nomes de casais escritos sobre o metal.(…)
Salvador, não ama a arte pública, fato!
Conhecida pelos seus próprios habitantes pelos lindos monumentos que compunham o cenário físico da cidade, a capital da Bahia hoje é um conglomerado de ruas sujas, muros pichados, becos e vielas redutos de consumo de crack e pelos seus monumentos degradados sejam pela memória ou pelo vandalismo.
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Fonte: Correio da Bahia |
Eu, enquanto artista plástico posso tecer duas óticas (ambas terríveis) sobre a degradação da memória artística da cidade. A primeira, no que tange a degradação do patrimônio público, resulta em um descaso dos órgãos responsáveis pela preservação do patrimônio artístico e cultural. você já veio ao Pelourinho? Não? Então venha. Mas não se arrependa! O tradicional cartão postal de Salvador hoje é guarnecido por apenas sete policiais (isso mesmo) que não dão conta do imenso número de furtos, roubos de carro e consumo de crack abertamente. Me refiro o Pelourinho para ilustrar a situação que o patrimônio artístico e histórico vem sofrendo.
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Enquanto Eliana Kertéz expõe em Brasília, as Gordinha de Ondina vão penando pela falta de cuidado. Fonte: Correio da Bahia. |
Não é incomum ver moradores de rua, se alojando perto de monumentos ou até dentro deles, na tentativa de se protegerem do frio ou da agressão de outros tornando esses espaços perfeitos para a aglomeração de comunidades de moradores de rua e, em alguns casos, de pequenos criminosos comuns. É o caso do rapaz estudante da UFBA que morreu no Jardim Campo Grande assassinado por dois supostos moradores de rua. Eu mesmo, com alguns colegas, ao sair da Escola de Belas Artes íamos às quintas para o jardim para tocar violão e beber vinho e já chegou ao ponto do policial responsável pela segurança da praça nos dizer "Ou fica dentro ou fica fora. Meia noite fecha pra todo mundo.". Não questiono o fato de fecharem a praça, isso é até aceitável para não sobrecarregar as unidades da polícia com uma vigília de um lugar que pode ser lacrado para a preservação de seu conteúdo que diga-se de passagem, custou cara sua reforma na época do governo de ACM, o que acabou desconfigurando o desenho original da praça, mas isso era marca dele, vide a praça da Inglaterra no Comércio.
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Não adiantou o Siron Franco reclamar. Deixaram até o último painel ser arrancado e nada foi feito para preservar sua obra, que é nossa também. Fonte: Correio da Bahia |
Não se desenvolvem políticas públicas de preservação do conjunto de monumentos espalhados pela cidade. O motivo? Cuidar de arte custa caro, e no caso de degradação das mesmas é mais fácil colocar a culpa na gestão anterior e está tudo bem. De fato, vem funcionando essa estratégia nefasta de embate político há mais de 20 anos e nada se resolve. As obras do Professor e Artista Visual Juarez Paraíso são um exemplo claro. Se você for ao CAB (Centro Administrativo), na Avenida Paralela, verá um dos seus mais lindos murais completamente desmembrado, sem contar que sua obra já foi vitimada outras vezes por intolerância religiosa. Feliz é a Professora e Artista Visual Nanci Novais que tem obra no CAB mas, devido ao abrigo em que ela se encontra acaba sendo preservada não pelo rico valor artístico mas por ser tratada como um móvel ( a pesada proteção policial no local).
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Obra de Mario Cravo Jr., o Monumento em homenagem à Clériston Andrade pegou fogo no domingo (20). Suspeitam que o incêndio seja de origem criminosa. Fonte: Correio da Bahia. |
Outra ótica, como disse anteriormente é a do feedback do cidadão. Essa peça fundamental para a preservação e conservação da obra não se preocupa pela perpetuação da memória e isso é fato. Vejo pessoas que urinam no monumentos, que depredam, picham, se apenas falasse mal, mas precisam agredir e sujar. O Carnaval é a prova disso, ou estou mentindo? Mesmo com tapumes e toda pseudo-proteção ao redor das obras, ainda assim elas são alvo de latas de cerveja (às vezes com líquidos diferentes dentro da lata). E o que resulta isso tudo? "Maldita cidade suja, tenho nojo daqui!". Isso mesmo, o descaso moral criado pela falta de esforço em preservar o ambiente em que se vive. Um esforço que deve ser coletivo, até porque não podemos depender do poder público para tudo como a história ensina.
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Fonte: Correio da Bahia |
Agora, para 2014, algumas obras serão restauradas às pressas para que Salvador não pareça tão abandonada, até porque as obras que serão alvo desses restauros relâmpago estarão no circuito da turistada que virá ver a Copa do Mundo. Enfim, voltamos ao Festival de Maquiagem Urbana da Grande Soterópolis que visa mascarar os problemas reais transformando a capital em uma cidade cinematográfica para que os visitantes não vejam como ela está, de fato. Lamentável!
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Arena Fonte Nova: Milhões para se construir um "coliseu" cercado de patrimônio depredado e mal conservado. |
Poderíamos fazer muito mais com os milhões da reforma da Fonte Nova na conservação do patrimônio artístico e cultural da cidade e ainda atrairíamos mais turistas que o usual sem a dor de cabeça de termos ruas interditadas para a execução dos jogos. Depois que os convidados vão embora, somos nós quem limpamos a sujeira da festa.
segunda-feira, 21 de outubro de 2013
POÉTICAS DO DIA-DIA - O Brasil saiu da "Rehab" de Vinicius.
Breve consideração à margem do ano assassino de 1973
Que ano mais sem critério
Esse de setenta e três…
Levou para o cemitério
Três Pablos de uma só vez.
Três Pablões, não três pablinhos
No tempo como no espaço
Pablos de muitos caminhos:
Neruda, Casals, Picasso.
Esse de setenta e três…
Levou para o cemitério
Três Pablos de uma só vez.
Três Pablões, não três pablinhos
No tempo como no espaço
Pablos de muitos caminhos:
Neruda, Casals, Picasso.
Três Pablos que se empenharam
Contra o fascismo espanhol
Três Pablos que muito amaram
Três Pablos cheios de Sol.
Um trio de imensos Pablos
Em gênio e demonstração
Feita de engenho, trabalho
Pincel, arco e escrita à mão.
Contra o fascismo espanhol
Três Pablos que muito amaram
Três Pablos cheios de Sol.
Um trio de imensos Pablos
Em gênio e demonstração
Feita de engenho, trabalho
Pincel, arco e escrita à mão.
Três publicíssimos Pablos
Picasso, Casals, Neruda
Três Pablos de muita agenda
Três Pablos de muita ajuda.
Três líderes cuja morte
O mundo inteiro sentiu.
Ôh ano triste e sem sorte:
– Vá pra puta que o pariu!
Quando Vinícius de Moraes escreveu seu lamento pela morte de Neruda e dos não menos importantes "Pablos" (Casals e Picasso), sua alma ficou órfã também. Hoje, somos 100 vezes mais órfãos, pois além de não temos o ronco adocicado do Violoncelo de Casals, a pincelada agressiva e atraente de Picasso, nem a tátil carícia da poesia de Neruda, Vinícius nos deixou na ilusão de um Brasil onírico, sensual, cheiroso, poético e exótico, livre da selvageria do mercado consumidor, no qual você poderia tomar uma cerveja e ter direito ao horizonte, sem que as empreiteiras tomassem as orlas para construir os seus hotéis, residenciais que jamais os nativos apreciarão, apagando a identidade local com mais uma safra de produtos "mira my friend". Não sou amigo desses, desculpe.
Fico com suave batucar de Vinícius na mesa ouvindo o violão de Caymmi e paquerando Iemanjá do outro lado do mar.
Devolvam meu horizonte!
Picasso, Casals, Neruda
Três Pablos de muita agenda
Três Pablos de muita ajuda.
Três líderes cuja morte
O mundo inteiro sentiu.
Ôh ano triste e sem sorte:
– Vá pra puta que o pariu!
Quando Vinícius de Moraes escreveu seu lamento pela morte de Neruda e dos não menos importantes "Pablos" (Casals e Picasso), sua alma ficou órfã também. Hoje, somos 100 vezes mais órfãos, pois além de não temos o ronco adocicado do Violoncelo de Casals, a pincelada agressiva e atraente de Picasso, nem a tátil carícia da poesia de Neruda, Vinícius nos deixou na ilusão de um Brasil onírico, sensual, cheiroso, poético e exótico, livre da selvageria do mercado consumidor, no qual você poderia tomar uma cerveja e ter direito ao horizonte, sem que as empreiteiras tomassem as orlas para construir os seus hotéis, residenciais que jamais os nativos apreciarão, apagando a identidade local com mais uma safra de produtos "mira my friend". Não sou amigo desses, desculpe.
Fico com suave batucar de Vinícius na mesa ouvindo o violão de Caymmi e paquerando Iemanjá do outro lado do mar.
Devolvam meu horizonte!
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Vinicius de Moraes Arte: Rodolfo Carvalho |
quarta-feira, 16 de outubro de 2013
POLÍTICA EM ANÁLISE - O Fascismo Nosso de Cada Dia
É comum no dia a dia, nos posicionarmos frente a questões de ordem política, cultural, econômica e social de uma maneira extremada e isso fica evidente nas redes sociais. Na maioria dos casos, muitas opiniões sobre acontecimentos noticiados demonstram a indignação dos usuários, evidente que, quem não irá se indignar com o relato de algum episódio grave de violência, injustiça ou impunidade? Por outro lado, chama atenção a maneira de expressar a indignação através de comentários que se configuram em opiniões de tendências notadamente fascistas. Manifestações de idéias totalizantes, recheadas de uma moral embotada e desgastada, repleta de preconceito e violência; seria a violência, por exemplo, a melhor forma de combater a violência? A resposta parece clara ao buscar na opinião disseminada pelas redes sociais.
Cito a violência, pois, no momento o assunto mais comentado
e compartilhado é a ação frustrada de um bandido ao tentar roubar uma moto em
plena luz do dia; logo após tomar o veiculo do proprietário, o assaltante é
pego de surpresa por um policial de passagem após o serviço; notando o evento
em curso, exerce sua função como profissional de segurança neutralizando o
bandido e garantindo a proteção da vida do cidadão e do seu patrimônio; uma
ação bem sucedida, diga-se de passagem, por outro lado, o que venho questionar
não é a ação em si e sim, a nossa reação frente ao episódio. Uma frase que
resume grande parte dos comentários: “bandido bom, é bandido morto!”. Isso é
praticamente um mantra em nossa sociedade e por trás deste mantra, está todo
nosso fascismo, reacionarismo e anacronismo para lidar com temas que envolvem
nossas mazelas sociais. Estamos habituados a fazermos julgamentos pautados em
valores morais tacanhos, sem nos darmos ao trabalho de refletirmos criticamente
sobre o que antecede a imersão de um individuo ao mundo do crime (por exemplo);
seria por uma condição ligada a uma pobreza de valores ou, questões intrínsecas
a um ambiente pobre de elementos verdadeiramente significativos para que ele
pudesse ter o PODER de escolha? O fim de todos a margem da lei tem endereço, o
cemitério. Talvez os defensores da meritocracia tenham a resposta. A minha
sanidade e meu juízo contaminado pelo esquerdismo será acusada de defender
bandido.
Somos violentos e cruéis em nossos julgamentos, queremos
sacrifícios em prol de um moral e visão de mundo beligerante e assassina; nossa
violência não se traduz apenas em balas e execução de foras da lei, mas, por
palavras, palavras que matam e humilham e não precisa ser ladrão de moto.
Recentemente tivemos o caso da mulher que acusou jogadores do Vitória de
tentativa de estupro, qual foi o julgamento (moral) da sociedade? Alguém
procurou ler os comentários? Nem irei reproduzi-los aqui. Depois foi noticiado
que não havia evidências persuasivas que comprovasse a tentativa de estupro;
voltamos aos comentários, após a notícia que invalidava a acusação, o que
encontramos? Comentários que só revelam outra característica comportamental
nossa, o machismo.
Esmagamos contra a parede tudo aquilo que nos escapa
enquanto idéia dominante de moral, verdade, ordem, sexo, costume; somos
totalizantes, ou seja, fascistas do ponto de vista conceitual, até porque
buscamos institucionalizar todas estas idéias totalizantes como forma de
garantir a manutenção de nossa ordem. Um exemplo? Cura gay. E o que dizer da
redução da maior idade penal?
Em “Anti – Édipo: Uma introdução à vida não fascista”, texto
que prefacia o Anti – Édipo de Deleuze e Guattari, Foucault ao longo do texto
nos oferece algumas perguntas e uma delas diz: “Como caçar o fascismo que se
incrustou em nosso comportamento?”. Mais a frente, ele sugere alguns pontos de
reflexão para nos desfazermos desta atitude fascista para com as coisas e
reproduzo a seguinte:
“Libere a ação política de toda a forma de paranóia unitária
e totalizante. Faça crescer a ação, o pensamento e os desejos por proliferação,
justaposição e disjunção, antes que por submissão e hierarquização do
pensamento. Libere-se das velhas categorias do negativo (a lei, o limite, a
castração, a falta, a lacuna) que o pensamento ocidental por tanto tempo
manteve sagrado enquanto forma de poder e modo de acesso a realidade.”
Nada disso é fácil de praticar, não é fácil abrirmos mão
daquilo que deu “certo” e nos trouxe até aqui. Por outro lado, repensar nossas
práticas, deduzo, tem o poder de nos levar mais a frente, já estamos presos no
mesmo lugar há um longo tempo. A violência não soluciona o problema da
educação, da saúde, da falta de ética na política muito menos a própria
violência. Vejo a disputa de projetos totalizantes no tabuleiro, pequenos
fascistas versus pequenos fascistas. Seguindo por este norte não temos MORAL
para MORALIZAR nada e dificilmente chegaremos a algum lugar digno, para que
possamos dizer ao fim de uma etapa: avançamos enquanto sociedade, enquanto
povo, enquanto nação.
Ricardo Oliveira - Psicólogo
POÉTICAS DO DIA-DIA - A Arte é Para Todos?
Sou artista visual e arte-educador e desde que iniciei oficialmente minha vida acadêmica há alguns anos, sempre me perguntei, o porquê da arte ser tão sacralizada ao mesmo tempo que é tão transcendental aos olhos das pessoas "comuns".
Me assusta o fato de museus aqui em Salvador serem tão deficientes de público enquanto em outras cidades com investimento sólido em cultura a realidade se diferencia consideravelmente. O que o museus de lá tem que os daqui não tem? E por quê as artes visuais são tão distantes das pessoas ao passo que a literatura, música, dança, teatro, mantiveram uma relação mais estreita com o público?
Talvez não haja resposta especifica pois muitos acusarão o cubismo com a complexidade imagética de Picasso, ou o Surrealismo de Magritte baseados nas leituras absurdas da psique humana, não sei ao certo, mas cada vez mais eu vejo o mesmo discurso "afffie, que coisa estranha!" ou "meu filho faz igual" e a obra a cada dia que passa dialoga menos com o público.
Não estou me referindo ao mercado como um todo, visto que muitos artistas contemporâneos tem obras significativas e de expressividade como a Patricia Piccinini e a sua leitura fortíssima e inquisidora do comportamento humano diante do incomum, ou o trabalho do Gil Vicente que gerou uma grande polêmica na Bienal de São Paulo de 2010 com desenhos que retratavam os grandes líderes mundiais ameaçados com armas na cabeça. A arte não é de impossível compreensão, ela é de difícil acesso.
O espaço do museu se tornou, aqui em Salvador, um espaço intimidador, e que desperta a desconfiança, principalmente em estudantes de escolas públicas que acreditam ser um lugar dedicado ao deleite das elites negando-lhes a presença. Na verdade parte disso é verdade. Durante anos as políticas públicas de investimento em arte visavam alimentar uma casta da sociedade com poder aquisitivo alto e chegar a esses lugares só tornava cada vez mais interessante, já que na época do governo Fernando Henrique foi reduzido o ensino das artes nas escolas. Um cenário, portanto não é complicado de se imaginar. O jovem que não teve o contato com arte na escola e não tem uma tradição familiar de gozo do conhecimento artístico vai despertar essa atração pela arte quando?
Defendo que a arte seja ela apresentada na forma de qualquer de suas milhares de facetas deve ser inserida com atenção no ensino fundamental e médio indiscriminadamente, seja no ensino privado ou público. A formação artística do indivíduo é fundamental para o desenvolvimento do olhar crítico do mundo que nos cerca e nos permite negar ou aceitar situações do dia-dia que nos são impostas constantemente.
Eu sou Rodolfo Carvalho, artista plástico, ilustrador e arte-educador.
Referências:
http://www.gilvicente.com.br/
http://www.patriciapiccinini.net/
http://file.org.br/?lang=pt
Me assusta o fato de museus aqui em Salvador serem tão deficientes de público enquanto em outras cidades com investimento sólido em cultura a realidade se diferencia consideravelmente. O que o museus de lá tem que os daqui não tem? E por quê as artes visuais são tão distantes das pessoas ao passo que a literatura, música, dança, teatro, mantiveram uma relação mais estreita com o público?
Talvez não haja resposta especifica pois muitos acusarão o cubismo com a complexidade imagética de Picasso, ou o Surrealismo de Magritte baseados nas leituras absurdas da psique humana, não sei ao certo, mas cada vez mais eu vejo o mesmo discurso "afffie, que coisa estranha!" ou "meu filho faz igual" e a obra a cada dia que passa dialoga menos com o público.
Não estou me referindo ao mercado como um todo, visto que muitos artistas contemporâneos tem obras significativas e de expressividade como a Patricia Piccinini e a sua leitura fortíssima e inquisidora do comportamento humano diante do incomum, ou o trabalho do Gil Vicente que gerou uma grande polêmica na Bienal de São Paulo de 2010 com desenhos que retratavam os grandes líderes mundiais ameaçados com armas na cabeça. A arte não é de impossível compreensão, ela é de difícil acesso.
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http://www.bulkka.com/patricia-piccinini/ |
Autorretrato matando Ariel Sharon, 2005, carvão sobre papel, 200 x150 cm Self portrait killing Ariel Sharon, 2005, charcoal on paper, 200 x 150 cm |
O espaço do museu se tornou, aqui em Salvador, um espaço intimidador, e que desperta a desconfiança, principalmente em estudantes de escolas públicas que acreditam ser um lugar dedicado ao deleite das elites negando-lhes a presença. Na verdade parte disso é verdade. Durante anos as políticas públicas de investimento em arte visavam alimentar uma casta da sociedade com poder aquisitivo alto e chegar a esses lugares só tornava cada vez mais interessante, já que na época do governo Fernando Henrique foi reduzido o ensino das artes nas escolas. Um cenário, portanto não é complicado de se imaginar. O jovem que não teve o contato com arte na escola e não tem uma tradição familiar de gozo do conhecimento artístico vai despertar essa atração pela arte quando?
Defendo que a arte seja ela apresentada na forma de qualquer de suas milhares de facetas deve ser inserida com atenção no ensino fundamental e médio indiscriminadamente, seja no ensino privado ou público. A formação artística do indivíduo é fundamental para o desenvolvimento do olhar crítico do mundo que nos cerca e nos permite negar ou aceitar situações do dia-dia que nos são impostas constantemente.
Eu sou Rodolfo Carvalho, artista plástico, ilustrador e arte-educador.
Referências:
http://www.gilvicente.com.br/
http://www.patriciapiccinini.net/
http://file.org.br/?lang=pt
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